Tive que fazer uma pausa nos textos sobre a África. Já tenho muita coisa escrita e outras ainda por escrever. Vou postar tudo aqui, o mais breve possível. O ano nem acabou e já aconteceu tanta coisa, tive que focar em outras andanças. Ainda vão render tantas outras histórias.
Mas o motivo de voltar aqui hoje é especial. Há exatos cinco anos, começava minha primeira aventura. O que fez passar muita coisa pela minha cabeça. Então ai vai resultado dessa mistura de saudade e agradecimento:
Trinta horas de viagem, voos longos e conexões demoradas. Da
janela do avião, apareciam algumas palmeiras depois de tanto oceano e sua
vastidão. Não sabia bem onde estava, a notícia de que para lá iria tinha sido
recém avisada. Minha primeira aventura seria na neve, mas os casacos tiveram que
sair da mala. Disseram-me que eu teria que ir para praia. Bom também, pensei.
Já que era para mudar, que mudasse direito. Das estações de esqui, direto para
o Havaí.
Meses de preparação, pesquisas e roteiros imaginados. Para
nada serviram, tudo cancelado. No meu almoço de despedida foi que tive a
notícia. Haviam outras alternativas, algumas mais parecidas. Mas não, aquela me
chamou mais a atenção. McDonald’s, Maui. Maui, Maui... já tinha ouvido falar daquele lugar. Talvez em algum seriado americano, destino de férias dos
californianos. No meio do Pacífico, custei a acreditar. Nem me importei onde eu
teria que ralar.
O ritmo era outro. Já no saguão do aeroporto, ouvi o vento
beijando as palmeiras ali em frente. O som do ukulele suavizava os movimentos de todos, ainda encantados com o
colar de flores no pescoço. Aloha, sinta-se
em casa. Bem-vindo à ohana havaiana.
Estava implícito, aquela atmosfera praiana contagiava a quem chegava. Sentia-me
ao avesso, um passarinho que migrou ao contrário. Saiu da terra firme para
mergulhar no meio do aquário.
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Mapa do Hawaii |
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Maui |
Acordei completamente perdido, o fuso e tudo mais. Não sabia
onde estava, muito menos para onde ir. Qual o meu endereço? Desconectado do
mundo tecnológico e sem ninguém em casa para me guiar. Sai no jardim, ver o
mundo exterior para me orientar. Aquilo era real, não via a hora de começar a
explorar. Fui na esquina procurar por placas com o nome da rua. Demorei a
encontrar aquela tranquila viela de subúrbio no mapa da lista telefônica.
Makalii street, achei. Ponto de partida definido, o que vinha pela frente ainda
era desconhecido.
Meus companheiros de aventura começaram a chegar. Todos na
mesma situação que eu, perdidos no paraíso. Alguns sozinhos, outros em grupo. A
tranquila ilha mudou. Jovens e mais jovens falando uma língua esquisita
circulando por todo canto. O português praticamente tornou-se o idioma
não-oficial mais falado e comentado do lugar. Havia um pouco de espanhol
também. A leva de estudantes sulamericanos tinha se instalado, a temporada de
trabalho de férias tinha começado.
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Brazucas! |
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“McEscravos Feliz” |
O grupo de “McEscravos Feliz” era grande e multicultural. Brasil,
Paraguai, Eslováquia, Filipinas e Argentina. Dez pessoas por casa, mais ou menos. Em cada uma das três logo se formou uma
grande família. Era uma farra, ninguém se importava com a zona. Bem, só os vizinhos. O trabalho algumas vezes era cansativo, outras descontraído. Aloha, may I take your order? Falar
besteiras em português, aprender outras em Filipino. Criar os próprios
sanduíches, fazer sundae em um copo
gigante com M&M’s a vontade, dar
voltas infinitas de sorvete em uma casquinha. Tudo no capricho do jeito que sonha
toda criancinha.
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Partiu praia?! |
Nas horas de folga era para a praia que a galera ia. Ônibus,
carona ou a pé mesmo. Tudo para dar um mergulho no mar, aprender a surfar, com
os peixes nadar. Nada de luxo ou ostentação, a simplicidade era nossa
diversão. Hora de ir mais além. Todos na caçamba da velha caminhonete ou no
jipinho alugado, para termos mais espaço. Subir o vulcão no meio da madrugada ou
descobrir os segredos do outro lado da ilha. A cada paisagem que saia do mapa
para nossas retinas, mais embasbacados a gente sorria.
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Amanhecer congelante no topo do vulcão |
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Despedida |
Chegava a hora de voltar, doía só de pensar. O efeito
surpresa tornou tudo único, especial. As coisas ocorreram como tinham de ser,
sem expectativas frustradas. Com espírito viajante, muito pude aprender. Estar
aberto para o novo, o desconhecido. Conviver com as diferenças, outras
realidades. Fazer amigos de todas as partes. Ser grato pelas oportunidades que
nos são oferecidas, buscar aproveitá-las ao máximo. Dar valor às pequenas
coisas, saber contemplar o que está a nossa volta. Pensei em mais tempo ficar,
já pertencia àquele lugar. Abraços de despedida, era hora da partida. A casa ia
ficando pequenina, enquanto ela sumia o coração ficava mais apertado. A
paisagem passava pela janela, um filme pela cabeça. Vi baleias a dançar no mar,
disse a elas que ainda haveria de voltar.
MAHALO, Hawaii!
Vídeo que fiz na época: