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Road trip |
Os dias passavam devagar, ao contrário da proximidade da
minha partida que se aproximava a passos de elefante desgovernado. Minha
vontade de me aventurar pelas paisagens sulafricanas só aumentava. Seriam meus
últimos dias de folga antes de cair de vez na estrada, rumo ao desconhecido! Já
tinha conhecido bastante coisa ali da região, mas ainda havia muito a explorar.
Eu e Chiara íamos pegar os mesmos days-off
para alugar um carro e ir mais longe, fora do raio de alcance da nossa base – o
Monkeyland. Logo, mais gente se animou e decidiu se juntar a nós. Kim e Farina
pediram os mesmos dias livres e nós quatro decidimos ir a Wilderness (parque
nacional a 100km de distância) no carro da Kim e dormir por lá. Não sei como
deixaram quatro voluntários tirarem folga ao mesmo tempo. Coitada da Emelia, a
inglesa, que se sentiu excluída e ficou sozinha em casa.
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Check list da Garden Route |
Depois de algum tempo isolado ali na fazenda, estava
eufórico em por o pé na estrada novamente – mesmo que por apenas dois dias. Meu
mochilão parecia deprimido ali no canto do armário, vazio por dentro. Depois de
enchê-lo com toda a parafernália, voltamos a ser como
Dean Moriarty e
Sal Paradise
– uma dupla sempre pronta
to be back “On the Road”!
Marylou também iria se
aventurar conosco, faltava saber quem seria sua representante.
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Vista de Knysna Lagoon |
Partimos lá pelas 9h da manhã, tínhamos nos programado antes
para aproveitar bem o tempo livre. A primeira parada foi em Knysna (lê-se "Náisna"). Tinha
estado lá na
semana anterior, fui o guia da vez. Levei-as direto ao mirante do
East Head. É aquele tipo de lugar em que se chega sem muita expectativa, quando
de repente:
Wooowww!!! A melhor
primeira impressão que se pode ter da cidade. Aquele cenário com penhascos
enormes, como um portal entre a lagoa e o mar de águas quase fluorescentes, nos
deixa hipnotizados. Fomos seguindo umas trilhas até as praias semi desertas que
viamos lá em baixo. Não bastava contemplar o lugar. Tínhamos que sentí-lo,
tocá-lo, experimentá-lo.
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Praias escondidas entre os rochedos em The Heads, Knysna. |
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Pizza exótica, Caffe Mario. |
Fomos almoçar no Waterfront, miniatura do famoso complexo em
Cape Town. Liguei para o Mikail, meu amigo de lá, para pedir dica de um
restaurante legal e convidá-lo para almoçar conosco. Para a sorte da Chiara, o
escolhido foi um italiano – Caffe Mario. Ela poderia matar a saudade
gastronômica da sua terra. Em meio a pizzas, saladas e espaguetes, a sensação
foi a pizza à moda da casa que o Mikail pediu e recomendou. Os ingredientes
eram abacate, banana, bacon, queijo e molho de tomate. A combinação não parecia
tão convidativa para aceitarmos a sugestão. Mas depois experimentei uma fatia,
até que não era tão estranho o sabor. Mandei embrulhar o que sobrou para
viagem, muito bom!
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Waterfront, Knysna. |
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Treino de water polo no meio do shopping |
O ambiente era agradável, depois da sobremesa ficamos
conversando e observando a paisagem. Estava tendo treinamento de polo aquático
das crianças da antiga escola do Mikail, bem ali no meio do shopping center.
Olhei as bandeirinhas de vários países
que faziam parte da decoração - ainda deviam ser resquícios da Copa do
Mundo, pensei. Mas serviam muito bem para representar aquele momento multicultural.
Brasil, Itália, Alemanha e África do Sul à mesa, comendo comida italiana; assistindo
a uma partida de um jogo inglês com jogadores afrikaans, descentes de holandeses; em volta a belas paisagens do
litoral africano, colonizado pela Holanda e Inglaterra àlguns séculos atrás.
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Craft market em Knysna |
Nos despedimos do Mikail e partimos. Antes de seguir para
Wilderness, paramos em uma feira de artesanto na beira da estrada – um craft market, toda cidade tem algum. Dei uma
volta rápida pelas barraquinhas, fugia dos vendedores grudentos. Não queria
comprar nada, economizando dinheiro e espaço na mochila. Fiquei esperando as
meninas na sombra de uma árvore, observando o cotidiano daquelas pessoas – esculpindo
suas obras, fonte do seu sustento.
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Wilderness vista da estrada |
Pegar a estrada depois do almoço dá um sono! Pobre da Kim
que foi dirigindo sem ninguém para conversar. Logo estávamos em meio às lagoas
e florestas do
Wilderness National Park,
muito verde ao redor! No mapa, o nosso albergue (
Wild Farm) não parecia longe
do centro da cidade. Só que ele era no topo de uma montanha, a estradinha de terra
adentrava a vegetação rumo ao cume. Quando a poeira que o carro levantava dava
uma trégua, as paisagens já iam nos dando uma prévia da vista lá de cima. Fomos
recompensados por uma vista de 360° da região; Oceano Índico, lagos, montanhas,
animais, fazenda, natureza! Fizemos o check in, deixamos nossas coisas no
quarto e partimos para uma praia ali perto, Victoria Bay.
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Panorama do Wild Farm Backpackers |
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Vic Bay |
Vic Bay, para os
íntimos, é um famoso point de surf. Todas as atenções estão voltadas para as
ondas, um clima bem
North Shore – a
famosa costa norte da ilha havaiana de Oahu, meca dos surfistas. Depois de ir
descendo as montanhas pela estrada que serpenteia seu vale, chega-se a uma praia
minúscula. O cenário é completado por um calçadão nas encostas das montanhas
com algumas casas de veraneiro, um pier e um albergue com pub – uma
vibe muito tranquila. Era final da
tarde, o sol já estava atrás das monhanhas e o vento estava frio. Apreciamos a
paisagem, demos um pulo no mar e fomos embora. Compramos alguns mantimentos na
cidade e voltamos correndo para o
Wild
Farm, não podíamos perder o por do sol lá de cima.
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Chuveiro com direito a vista |
Chegamos bem na hora,
o crepúsculo estava perfeito para fotos irradiantes! Até do chuveiro dava para
contemplar aquele visual. Nunca tinha tomado um banho vendo um por do sol
daquele, talvez uma ducha em alguma praia do Hawaii. O sol se foi e o frio
chegou. Vinho caiu bem para acompanhar o macarrão com molho de pózinho. Para
descontrair começamos a jogar cartas, ensinei o
Kings Cup para as meninas. Foi muito engraçado! Chiara não aguentou
e passou a beber chá – virou a “
Tea
Loser”!
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Vinho sul-africano |
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King's Cup |
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Chiara, "tea loser"! |
Conhecemos uma alemã, Cláudia, que falava espanhol também.
Ela é mais velha, disse que sempre passa longas temporadas viajando. Já morou
na Argentina e esteve em Porto Alegre. Com a Farina ela falava em alemão, comigo
e a Chiara em espanhol e inglês com todos. Ela foi dormir e depois voltou
correndo falando que tinha uma aranha no quarto dela e não iria conseguir
dormir sabendo que ela estava ali. Fui lá matar a aranha!
Quando as meninas decidiram ir para o quarto, não achamos a
chave. A última vez que a vimos foi na cozinha, no jantar. Será que alguém
tinha pego por engano? Tentamos lembrar de todos que passaram pela cozinha enquanto estávamos ali. Fomos acordar um por um para perguntar. No fim descobrimos
que estava no quarto da alemã, tinha deixado lá quando fui matar a aranha. Fiz
uma fogueira lá fora. O vinho, as estrelas, o fogo, o clima esquentou.
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Café-da-manhã panorâmico |
Tomamos um café da manhã reforçado na varanda panorâmica do
bar, com direito a frutas orgânicas produzidas na fazenda. E o melhor, estava
incluído na diária! Tínhamos um dia repleto de contato com a natureza pela
frente. Fizemos o
check out e peguei na recepção dois guias de mochileiros,
Coast to Coast e
Alternative Route, que foram muito úteis. Listavam todos os albergues
das cidades no meu roteiro. Era só pesquisar lá, pedir dicas de outros
viajantes, ou do
staff dos
hostels, e decidir para onde ir.
Alugamos nossas canoas na
EdenAdventures, dentro do Wilderness National Park. Fomos remando rio acima em meio
a um vale com floresta nativa, respirando a natureza com todos nossos sentidos!
O curso d’água ia se estreitando e ficando cada vez mais raso, “estacionamos”
nossa canoa nas pedras e pegamos a trilha para a cachoeira. A “trilha” era na
verdade uma passarela de madeira suspensa entre as árvores, uma caminhada
tranquila de meia hora na floresta. O filete d’água entre as pedras era
insignificante, até que foram surgindo umas piscinas de coca-cola cada vez
maiores e barulhentas. Chegamos às cachoeiras, imensos blocos de pedra
represando águas escorregadias que pulavam de lá para cá. Piquenique na sombra,
sonecas ensolaradas, mergulhos arrepiantes, paz na mente.
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Parecia que estávamos fora por uma semana e foram só dois
dias. Voltamos para a rotina de voluntários no Monkeyland, os macaquinhos
estavam com saudades. Minha última semana de trabalho ia ser intensa: duas
voluntárias novas,
visita das crianças guiada por mim, aventuras, planejamento,
caledário, decisões, despedidas...
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